História

Vai  gostar  de  doce  assim



A nossa turma era levada.

Muito menino cheio de estripulias.
Eu, Vandão de Nestor, Washington Sabino, Mádson, Jordão, Paulo do Sargento, Nanô, Marquinhos de Manu, Tonhão, Liberato, Cícero, Tico, César (irmão de Tico, hoje, Da Mata) e tantos outros garotos de uma época nobre o deliciosa de Montalvânia.

Tomávamos, todo santo dia, banho do Cochá, brincávamos de bang-bang nas ruas, jogávamos futebol no campão, na quadra do Clube Camponês, bolinha de gude em tudo quanto é canto e, nos finais de ano, íamos seguindo os violeiros nas folias de Reis.

Aí é que está o cerne de nossa história (com agá porque é verdadeira). Dentre esses e mais os \"tantos outros\" havia um colega, o qual chamá-lo-ei de Luizinho e dar-lhe-ei filiação de D. Izaura. Pois, ora, pois. Luizinho era, de nós, o mais levado e sem-vergonha. Em toda e qualquer festa, era o primeiro a enfiar a mão nos quitutes oferecidos.

D. Izaura tinha muita vergonha do \"maleducado\" (assim mesmo, com erro de português e tudo).

Dias daqueles, festa de Santos Reis na Vila Nova, casa de seu Jerônimo Baixinho, a viola comia solta.

É claro, D. Izaura e seu filhote estavam presentes. Ela, anteriormente, na saída de casa, advertiu severamente ao pimpolho de que Ele só aceitaria qualquer guloseima que Ela confirmasse. Ainda, disse-lhe que não aguentaria do moleque qualquer descompostura, haja vista que o sem-vergonha era useiro e vezeiro na boca-porca. Todos os palavrões se lhe sobrepunjavam a mente.
Era mestre nisso.

A mãe, contudo, lhe havia, além de ofertas de belos puxões de orelha, mostrado uma cinta de couro cru que, certamente, iria ao seu lombo assim que perpetrasse qualquer malandragem que enverganhasse o bom nome da família izaurina.

Bem, na festa, o que era comum naquele tempo, sobrevinham cestos de deliciosos quitutes.

O primeiro a ser servido pela filha de \"Jerumim\" foi peta. Ofertado o petisco ao Luizinho, esse, lampreiro, leva a mão à cesta, mas foi severamente repreendido por D. Izaura. \"Ele num quer não. Nun gosta de peta\". Luizinho franziu a testa, grunhiu qualquer coisa e aboletou-se quito ao canto da sla. Olhou furibundo a mãe e sapecou baixinho palavras ininteligíveis.

Mais tarde, novamente outra cesta de biscoito roda a sala. Desta vez, pão-de-queijo. Os olhos de Luiz brilharam. Ao levar a mão a cesta, novamente D. Izaura alardeou. \"luizinho quer pão-de-queijo não. Ele num gosta\". O menino arrepiou. Olhou para a mãe de cima a baixo e quase vociferou palavrões. Contudo, lembrou-se da cita de couro cru e aquietou-se.

Mais tarde, uma bandeja de bolo de fubá...o preferido do moleque, que, babando, avança sobre a bandeja. A mão de D.Izaura o freiou: \"gosta não. Quer não\". Essa foi de lascar, luiz foi ao fundo do poço.
Mas resignou.
Então veio o doce de leite. Aquele delicioso doce de leite em postas, cortado, durinho, cheiroso, maravilhosamente bem feito por D. Catarina, esposa de Seu. Jerumim. Tão bom quanto o doce feito por D. Maria de seu Nestor, mãe de Vandão. Luizinho levou a mão já deliciando aquela guloseima.

Com a mão já na borda da bandeja escuta a Velha D. Izaura afirmar: \"Ele nun qué não. Luzinho não gosta de doce. Nun gosta não\".

Aí foi demais, o rebento, torce o nariz, respira fundo, olha para a mãe com olhar de tatu enjaulado, encara bem a mãe e diz: \"num gosta...num gosta...olha a bestage de mãe? Eu já dei até o cu por um pedaço de rapadura num vô gostar de doce de leite?\"

Enviada por: Cid Olímpio